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Notícia

07/03/2016 09:01:18

“É preciso falar sobre saúde mental dentro das empresas”

A recomendação é da psicóloga e consultora Fátima Macedo. A depressão e ansiedade já estão entre os males que mais afetam os funcionários.

A analista comercial Maria da Silva* tinha um cotidiano comum e dormia normalmente. Há um ano, essa rotina mudou. Ela começou a acordar durante a noite e não conseguia mais voltar para a cama. No início, ela achou que era um distúrbio do sono, mas outros sintomas começaram a aparecer.

Atividades prazerosas – como ir ao cinema ou sair com os amigos – se tornaram um martírio. Aos poucos Maria* começou a se isolar. Nos finais de semana, quase não saía de seu apartamento, na zona sul de São Paulo.

O desânimo começou afetar sua produtividade no trabalho. Ao procurar ajuda médica, veio o diagnóstico: depressão.

O problema não é pontual, e sim mundial. Uma pesquisa recente publicada pela Business in the Community (BITC) revela que as doenças mentais já são a principal causa de afastamento do trabalho no Reino Unido.

No Brasil, a depressão está na terceira posição dos males que afetam funcionários, os primeiros ainda são traumas e lesões musculares.

Mas essa lista deve sofre alterações nos próximos anos. De acordo com um estudo da Organização da Mundial da Saúde (OMS), até 2030 a depressão deve ser a doença que mais afetará pessoas no mundo.

Além de gerar um grande sofrimento para quem é afetado, esse mal atinge diretamente as empresas. Uma pessoa depressiva perde em média oito dias por mês de trabalho, para outras doenças a média é de apenas dois.

“Parte das empresas está preocupada com essa questão, mas algumas ainda têm receio de debater o assunto abertamente no ambiente de trabalho”, afirma psicóloga Fátima Macedo, fundadora da Mental Clean, consultoria especializada em saúde mental.

TABU

Nos séculos passados, os sintomas associados a problemas mentais eram considerados como desvios de comportamento. Em algumas sociedades, a depressão, por exemplo, era vista como preguiça ou falta de fé.

E mesmo hoje, com desenvolvimento da medicina, algumas pessoas encaram o diagnóstico de transtorno mental como algo criado na mente do individuo, e não realmente como uma doença. E há ainda quem acredite que ansiedade ou depressão são sinais de fraqueza emocional.

O silêncio de algumas empresas sobre o tema ajuda a estigmatizar o assunto. Há empresários, de acordo Fátima, que não tocam no tema por receio de que essas doenças sejam associadas ao ambiente de trabalho ou de que o debate levante uma demanda contida.

Há outras empresas que têm uma falta de visão sobre os reais efeitos dessas doenças na produtividade de seus funcionários e consideram essas assistências apenas como custos e não investimento.

“É fundamental que pessoas olhem para essa doença de forma natural e sem preconceitos”, afirma Fátima. “Existem diversos fatores que podem desencadear essas doenças – que nem sempre estão relacionados aos trabalhos – podem ser questões pessoais ou hereditariedade.”

PROJETO

Apesar dessas barreiras, a demanda por programas que ajudam a diagnosticar e tratar funcionário com doenças mentais está crescendo dentro das grandes empresas.

A construtora Abyara e a mineradora Vale, por exemplo, têm projetos que apóiam o bem-estar psicológico de seus funcionários. A multinacional Unilever é umas pioneiras no Brasil em projetos de apoio psicológico.

Mesmo em pequenas empresas – que têm menos recursos – é possível adaptar esses programas para caber em qualquer orçamento, de acordo com Fátima Macedo.

É o caso da Feitiços Aromáticos, produtora de cosméticos sustentáveis de Itaquera, bairro da zona leste de São Paulo. Raquel da Cruz, cofundadora da empresa, decidiu implementar um projeto de saúde mental depois que conheceu o trabalho da Mental Clean.

“Temos uma preocupação grande com o treinamento dos nossos funcionários, com da comunidade ao redor da empresa e com sustentabilidade. Ter um programa que ajuda a saúde mental foi mais passo para garantir a qualidade de vida da nossa equipe”, diz Raquel.

Feitiços Aromáticos tem 18 funcionários que receberam um treinamento básico e que recebem periodicamente boletins sobre o tema. Caso seja necessário, a empresa custeia o tratamento ou parte dele.

“Acho que a maioria dos empresários considera, isso como apenas um gasto, mas na verdade é um investimento faz para ter um funcionário mais capacitado”, afirma Raquel.

GESTORES

De acordo com a pesquisa realizada pela Business in the Community(BITC), grande parte da responsabilidade nesses programas é dos gestores, gerentes ou qualquer funcionário que está no topo do organograma.

Isso porque eles passam grande parte do tempo gerindo equipes, por isso têm mais condições de identificar mudanças de comportamento como, queda na produtividade, desânimo, afastamento dos colegas de trabalhos, sono excessivo, mudas repentinas de humor, agitação, perda de apetite e fadiga.

De acordo com Fátima, da Mental Clean, não é papel de gerentes diagnosticar quais doenças seus funcionários têm, e sim ficar atento a mudanças de conduta.

Assim que forem observadas alterações, o próximo passo é realizar uma conversa com o funcionário para entender o que está acontecendo e, se for o caso, encaminhar para o programa de qualidade de vida da empresa ou para o departamento que possa auxiliar, como recursos humanos.

Para que esse processo aconteça de forma positiva, o relatório da BITC recomenda que exista transparência das empresas na hora de tratar temas doenças mentais e que as empresas demonstrem que esse é um problema crítico que merece cuidados e atenções redobradas.

Outro fator apontado no relatório é que exista um programa de capacitação básica para gestores para que eles possam agir da forma mais adequada. Além disso, é importante que esses profissionais tenham autonomia para criar ambientes positivos e para serem flexíveis com cada um dos funcionários.

Os gestores, por outro lado, trabalham longas horas e têm muitas responsabilidades, por isso eles têm que estar com a saúde mental em dia para poder ajudar a equipe. De acordo com a BITC, isso tem que ser levado em consideração na hora de recrutar ou promover um funcionário.

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